Brasília — O Brasil caminha para exportar, pela primeira vez, mais de 1 milhão de bois vivos em um único ano. De janeiro a novembro de 2025 foram embarcadas 952 mil cabeças, superando as 948 mil registradas em todo o ano de 2024, apontam dados do Comex Stat, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), e projeções da ONG Mercy For Animals (MFA).
Se a média mensal for mantida, pelo menos outras 86 mil cabeças devem deixar o país em dezembro, consolidando o Brasil como o maior exportador mundial de bovinos vivos por via marítima.
Demanda externa e recuo de concorrentes
O avanço nas vendas é atribuído a fatores conjunturais e estruturais. França e Espanha suspenderam suas exportações após um surto de dermatose nodular contagiosa, elevando a demanda do Norte da África pelo gado brasileiro. Só o Marrocos recebeu cerca de 150 mil animais até novembro, quase quatro vezes mais que em 2024.
Outro concorrente tradicional, a Austrália, perdeu competitividade desde que impôs regras mais rígidas para navios em 2019. Nos onze primeiros meses de 2025, o país embarcou 638 mil bovinos, abaixo das 772 mil cabeças exportadas no ano anterior.
Pressão legislativa
Apesar dos números em alta, o tema segue em debate no Congresso. Desde 2018, quando uma operação com 27 mil bois causou forte poluição no Porto de Santos (SP), a atividade enfrenta tentativas de restrição. A Mercy For Animals articula projetos que buscam limitar ou encarecer as remessas de animais vivos.
Na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara, já avançaram o PLP 23/2024, da deputada Luciene Cavalcante (Psol-SP), que retira o benefício fiscal da Lei Kandir para o setor, e o PL 786/2024, do deputado Nilto Tatto (PT-SP), que amplia a tributação sobre a atividade.
Outro texto em discussão é o PL 2627/2025, da deputada Duda Salabert (PDT-MG), que propõe reduzir as exportações em 20% ao ano por cinco anos e estabelece regras mais rígidas de bem-estar animal e segurança marítima. O projeto será tema de audiência pública marcada para 11 de dezembro.
Incidentes reforçam debate
Casos recentes alimentam a pressão por mudanças. O navio Spiridon II, que deixou o Uruguai em 20 de setembro com 3.000 vacas, foi impedido de atracar na Turquia e só desembarcou em 23 de novembro na Líbia. Relatórios indicam 48 mortes a bordo, 146 animais sem identificação adequada e 469 com brincos inconsistentes, gerando preocupações sanitárias.
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Para George Sturaro, diretor de Relações Governamentais da MFA, episódios desse tipo mostram a necessidade de “regulação mais severa”. Segundo ele, parte dos parlamentares ainda resiste às propostas, mesmo em estados que não exportam animais vivos, mas vendem carne refrigerada ao Oriente Médio.
A deputada Ana Paula Lima (PT-SC) também apresentou projeto que proíbe a exportação de animais vivos. O texto recebeu parecer contrário do deputado Rodolfo Nogueira (PL-MS) na Comissão de Agricultura, surpreendendo segmentos do mercado, já que o Mato Grosso do Sul não realiza embarques desse tipo.
Mercado segue atraente
Apesar dos riscos e da crescente oposição, produtores mantêm interesse na atividade. Segundo representantes do setor, compradores do Oriente Médio pagam entre 15% e 25% a mais por animais vivos que atendam requisitos específicos, margem superior à obtida com carne refrigerada.
Historicamente, acidentes graves marcam o debate. Em 2015, o naufrágio do navio Haidar com quase 5.000 bois provocou grande desastre ambiental em Barcarena (PA). Três anos antes, 2.750 animais morreram por pane no sistema de ventilação do MV Gracia Del Mar. No Porto de São Sebastião (SP), moradores reclamam de trânsito e mau cheiro durante os embarques.
Mesmo sob críticas, o Brasil deverá fechar 2025 com novo recorde e liderança global no transporte marítimo de bovinos vivos.
Com informações de Poder360

